Viagora

Advogado de Zé Simão não descarta possibilidade de pedir exumação do corpo de Gercineide Monteiro

"Na investigação em crime de homicídio existem várias perguntas que tem que ser respondidas e que não chegaram a ser completadas", disse Nazareno Thé em entrevista ao GP1.

Em entrevista ao GP1, o advogado criminalista Nazareno Thé, responsável pelo caso de Zé Simão, ex-prefeito do município de Lago do Sítio, acusado de ser o autor do homicídio da esposa Gercineide Monteiro, e o médico legista George Sanguinetti falaram sobre os laudos cadavérico e da perícia do local do crime. Eles apontaram diversos erros nos documentos e não pouparam críticas aos responsáveis pelos laudos.

Sanguinetti foi contratado pela defesa do ex-prefeito para elaborar um novo laudo e mostrar que os documentos referentes à perícia do local e do corpo não comprovam a autoria do crime por arte de Zé Simão. O médico legista afirma que a metodologia legal para a elaboração dos laudos não foi obedecida. “O documento médico legal não é um documento lícito, é um documento equívoco e com erros e eu tenho certeza que o Sr. Juiz irá mandar corrigir ou não vai considerar”, avaliou.

George Sanguinetti sustenta que, mesmo com todos os erros contidos nos laudos do IML, não há nenhum indício que ligue Zé Simão ao assassinato da ex-primeira-dama. “Nada liga ao prefeito José de Arimatéia [Zé Simão]. Não tem nada que tenha o mínimo de vestígio para incriminá-lo”, afirmou.

A análise feita pelo médico legista aponta que diversos fenômenos cadavéricos (temperatura do corpo, percurso da bala na vítima, entre outros) que poderiam precisar a hora e as circunstâncias do crime foram deixados de lado e que apenas uma nova perícia no corpo poderia apontar tais fenômenos, para isso se faria necessário a exumação do corpo de Gercineide. “No corpo nós encontraríamos o que ele [perito] deixou de fazer, como mostrar o percurso do tiro”, disse.

O advogado também aponta que não havia motivos para que Zé Simão assassinasse a esposa. “Eles estavam vivendo em felicidade, viviam momentos felizes. Ela era auxiliar dele administrativamente lá na prefeitura. Era a pessoa que convivia com ele. Na noite anterior ela tinha ido de Teresina para Lagoa do Sítio, passando por Valença. Se ele tivesse um plano para matar essa senhora, teria sido muito mais esperto para no decorrer da viagem contratar uma pessoa pra dar tiros no carro, talvez desse até um tiro na perna dele para as coisas ficarem mais perto da realidade. Então, isso [o envolvimento de Zé Simão] não tem sentido. Não obedece a um critério lógico. Se você for ver pela lógica, esse acontecido é impossível”, avaliou.

Questionado sobre um possível culpado e a motivação para o crime, Nazareno disse já ter suspeitas. “Eu não posso ainda apontar [culpado e motivação], mas eu tenho algumas desconfianças. Já que o trabalho da polícia e da perícia local não foi eficiente, não municiou o Ministério Público de informações verdadeiras, e que induziu o Poder Judiciário ao erro, quanto a autoria do crime eu posso dizer que várias possibilidades estão na nossa mira, eu não posso eleger uma e deixar de lado todas as outras. Mas, o povo do local já começa a se manifestar com uma vertente política. Eu não sei de onde vem essa vertente e nem posso sugerir nomes. Eu preciso aprofundar essa vertente e preciso investigar, eu estou tomando as providências necessárias e com carta branca da família para fazer as minhas incursões até mesmo dentro da cidade para tentar esclarecer [o crime]”, declarou.

O médico explica que existem diversos tipos de fenômenos cadavéricos que auxiliam a perícia a entender as circunstâncias do crime e apontar um possível horário de morte. “Quando alguém morre, nós temos o resfriamento progressivo do corpo, nas três primeiras horas a pessoa esfria meio grau por hora, a partir da quarta hora um grau por hora, então, eles perderam uma boa oportunidade, isso é mensurável, todo instituto médico legal tira a temperatura média do cadáver e o Dr. [perito responsável pelos laudos] colocou apenas ‘cadáver bastante frio’, eu não conheço essa linguagem. Também os livores cadavéricos, quando alguém morre, cessando a circulação o sangue se deposita nas partes mais baixas do corpo e quando a perícia de local chega as 14:30 ocorre a mudança de posição e o livores acompanham essa mudança, então não havia ocorrido ainda as 8/10 horas de morte. Pelo raciocínio deles, se fosse a morte 1h da manhã os livores estariam permanentes”, observou Sanguinetti.

O perito aponta também o erro na análise do fator rigidez do corpo. “Ele registra que só havia rigidez cadavérica nas mãos. Quando alguém morre, nas primeiras duas horas a nuca e mandíbula apresentam rigidez, com mais duas horas os membros superiores, com mais duas horas o abdômen e a musculatura, com mais duas horas os membros inferiores, com 8/10 horas a rigidez total. Então de acordo com a lei há o desaparecimento dessa rigidez na ordem inversa, começando pelos membros inferiores. Então quando esse corpo chega ao IML só tem rigidez nas mãos. Que bate exatamente com meu horário de morte, entre 6 e7 horas da manhã”, disse.

Sanguinetti diz que o laudo não descreve corretamente o tipo de ferimento pois não cita o grau em que a arma estava ao ser disparada. “Há uma situação no laudo cadavérico que eu não consigo entender, o laudo cadavérico descreve o ferimento no seguimento cefálico na cabeça de dona Gercineide, como de traz para frente, ‘levemente de baixo para cima’ e ‘levemente da esquerda para a direita’, essa não é uma linguagem científica. Você tem que estabelecer um ângulo do projétil. Então você tem que saber onde está o atirador, esse grau tem que mensurar. O que é levemente? Levemente servindo como norma de direção?! Levemente a esquerda, levemente para baixo, não está correto”, analisou o médico legista.

Outra situação apresentada por Sanguinetti é a ausência de exames residuográficos na arma, nos suspeitos e demais pessoas que tiveram acesso a cena do crime.

O médico, disse, que até a posição em que Gercineide foi encontrada é descrita de maneira equivocada. “Eu não sei como os peritos daqui confundiram ao ponto de dizer que ela estava em decúbito central. Ela está lateralizada à direita. Ela está apoiada ao lado direito”, declarou o médico mostrando fotos da cena do crime.

O perito declara ainda que é incomum um laudo médico ser assinado por 5 profissionais, como acontece com o documento do IML. “No Código de Processo Penal, a partir de 2008, um perito só assina o laudo pericial, até então era dois. Chego aqui e encontro um laudo que parece um abaixo assinado, eu nunca vi isso. Cinco médicos assinam. Então sempre que eu vejo isso eu desconfio. É como se fosse para fortalecer”, observou.

Conclusão do laudo de Sanguinetti

Ao estudar os laudos, o médico legista George Sanguinetti elaborou um novo laudo e esclareceu ao GP1 quais foram suas conclusões. Sanguinetti aponta três situações no novo laudo: “A conclusão do nosso trabalho é bem objetiva. Resumida e objetiva. Primeiro: ‘os erros e contradições existentes nos laudos periciais os tornam inservíveis como documentos médicos legais e obrigatoriamente devem ser sanados’. Segundo: ‘não tem fundamentação científica a citação no laudo cadavérico que a vítima, Gercineide de Sousa Monteiro, tenha como horário provável de morte entre 1h e 1h30min do dia 10 de fevereiro de 2015’. Terceiro: ‘nos laudos periciais não há vestígios ou indícios para definir autoria’”, narrou.

Relacionamento entre Zé Simão e Noemia Maria

Em depoimento à Polícia, Noemia Maria declarou que mantinha um relacionamento amoroso com o ex-prefeito há cerca de dois anos, situação confirmada pelo advogado Nazareno Thé, que esclareceu como de fato acontecia o caso entre patrão e empregada. “Relacionamento não é uma coisa esporádica, é uma coisa que se perpetua ao longo do tempo. Ele teve um encontro ou outro esporádico”, ressaltou.

Em entrevista a uma televisão local na última sexta-feira (24), Noemia Maria voltou atrás e disse que tal relacionamento nunca aconteceu. Segunda ela, a declaração foi feita por Zé Simão e ela apenas assinou o depoimento.

O crime

A ex-primeira-dama do município de Lagoa do Sítio foi encontrada morta, em seu quarto, na manhã do dia 10 de fevereiro de 2015. Inicialmente, médicos da cidade declaram que o óbito tratava-se de morte natural por Acidente Vascular Cerebral (AVC), após alguns exames no corpo verificou-se que Gercineide Monteiro foi assassinada com um tiro na nuca.

Após a conclusão do inquérito, o delegado geral Riedel Batista afirmou que crime foi cometido por Zé Simão em coautoria com Noemia Maria. Ambos estão presos a disposição da Justiça.

Devido a acusação de homicídio, Zé Simão teve o mandato de prefeito cassado pela Câmara de Municipal de Lagoa do Sítio e foi expulso do PT, partido a que era filiado.

George Sanguinetti

O alagoano George Samuel Sanguinetti Fellows é médico legista, professor e político que tornou-se conhecido por participar da investigação de casos de repercussão nacional como o caso PC Farias, da menina Isabela Nardoni e do suposto homicídio de Eliza Samudio.

Ex-diretor do Instituto de Medicina Legal de Alagoas, o especialista em medicina legal é formado pela Universidade Federal do Pernambuco e lecionou Medicina Legal na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Alagoas por 32 anos.

Sanguinetti é coronel reformado da Polícia Militar de Alagoas e atualmente é vereador da cidade de Maceió.

 

Facebook
Veja também